O Espaço de diálogo sobre o Ensino Médio Público

segunda-feira, 4 de março de 2013

Redes Sociais, Tecnologia e Formação Humana: a questão linguageira




Por Doriedson S. Rodrigues[1]
“Na realidade não são palavras o que pronunciamos ou escutamos, mas verdades ou mentiras, coisas boas ou más, importantes ou triviais, agradáveis ou desagradáveis, etc. A palavra está sempre carregada de um conteúdo ou de um sentido ideológico ou vivencial” (BAKHTIN[2], 2006, p. 98-99)
Para início de conversa
                Com o advento do computador tivemos a possibilidade da internet e com esta a possibilidade de nos relacionarmos por meio das redes sociais. Trata-se de oportunidade ímpar para vencermos distâncias, denunciando realidades opressoras, mostrando o potencial de homens e de mulheres em diferentes lugares realizarem ações afirmativas em prol da emancipação humana, ou seja, da melhoria da qualidade de vida das pessoas.
            Contudo, mesmo diante de todas as tecnologias possíveis que acabam encurtando distâncias, tornando os homens mais conhecidos entre si, há um fato que se mantém como condição necessária para o aproveitamento de todas as inovações tecnológicas. Trata-se da linguagem, necessária para a comunicação quer por e-mail, twitter, facebook, orkut e outras redes sociais possíveis.

            É sobre linguagem e comunicação, em tempos de virtualidades, de inovações tecnológicas, que trato neste texto, objetivando dialogar com o leitor sobre como torná-las cada vez mais eficazes no interior das redes sociais. Procuro fornece-lhe alguns indicativos de como maximizá-las no interior de suas necessidades comunicativas, seja, por exemplo, para denunciar uma madeireira que vem esteja a destruir riquezas naturais de uma comunidade, seja para mostrar como determinada  comunidade vem desenvolvendo ações de desenvolvimento sustentável, preservando os recursos pesqueiros e frutíferos, por exemplo.
            Nossa intenção é indicar-lhe estratégias para usar a linguagem nas redes sociais de modo a alcançar seus objetivos. Para isso, considero importante compreendermos que a linguagem veicula ideologias, modos de ver, entender o mundo e nele intervir.

1 Linguagem e Ideologias
Para tratar de ideologia, começo falando de um estudioso da linguagem humana que entendia que, ao falarmos ou escrevermos, não são meramente palavras, substantivos, adjetivos, verbos, orações, predicados, sujeitos – essas coisas que as escolas não raro teimam em ensinar numa concepção metalinguística de ensino-aprendizagem de língua – que dizemos ou escrevemos ou escutamos, mas verdades ou mentiras, coisas boas ou coisas más[3]. Ou seja, o que fazemos com a linguagem é expressar modos de entender o mundo, convencer o outro, demonstrar sentimentos, expor ideologias, intervir no mundo. Segundo Chauí (apud PESSOA[4], 1989, p. 28),
[...] os homens produzem idéias ou representações pelas quais procuram explicar e compreender sua própria vida individual, social, suas relações com a natureza e com o sobrenatural. Essas idéias ou representações, no entanto, tenderão a esconder dos homens o modo real como suas relações sociais foram produzidas e a origem das formas sociais de exploração econômicas e dominação política. Este ocultamento da realidade social chama-se ideologia.

Contudo, a questão é que nem sempre esse modo de expressar o mundo, convencer o outro, demonstrar sentimentos e expor ideologias se colocam para quem lê ou escuta de modo claro, explícito. Às vezes, é preciso um esforço de leitura para entendermos e compreendermos o que o outro quis dizer e com que objetivos quis dizer.
Você já pode ter observado, por exemplo, uma situação em que alguém perto de você, numa noite de chuva, geralmente em sua casa, olha para o céu e diz “Nossa, tá chovendo. E tá chovendo forte!”. E você acaba interpretando essa expressão não como uma afirmativa sobre a realidade, mas como um pedido de empréstimo de um guarda-chuva ou como um pedido para um passar mais um tempo em sua casa até que a chuva passe.
Então, leitor, nem sempre as coisas são ditas ao pé da letra. Às vezes os entendidos estão nas entrelinhas do que se escreve ou se fala. Nessa perspectiva, por exemplo, suponhamos que você deseje produzir um vídeo sobre uma determinada comunidade, a fim de denunciar uma negativa de vida para com a existência humana. Em termos linguageiros, você poderá dizer as coisas de forma direta ou de forma atenuada, preservando a imagem pública da comunidade, dos membros da comunidade, evitando, às vezes, até processos. Nessa linha de raciocínio, por exemplo, há uma grande diferença em dizer “Fulano de tal é ladrão” e “É possível que fulano de tal seja ladrão”.
No exemplo acima, a introdução do elemento “É possível que ... seja” faz toda a diferença. Isto posto, conheçamos algumas outras estratégias de uso da linguagem utilizadas nas interações humanas para veicular valores, juízos, enfim, formar opiniões e cidadãos, portanto. Nesse sentido, estamos já a tratar de modalização da linguagem.
Modalizadores são elementos da linguagem, segmentais (palavras como talvez, pode ser, caso melhor juízo) ou supra-segmentais (tom de voz, silabação de uma palavra, por exemplo), que revelam as atitudes do autor de um texto sobre o discurso por ele produzido, expressando, p. ex., (in) certeza, (não-) comprometimento, atenuação de alguma carga preconceituosa sobre a linguagem, etc. Certa feita, uma pessoa chamara para outra de “ladrona” e por isso fora processado. Outra, entretanto, tivera o cuidado de expressar-se “É possível que seja ladrona”. Veja que na segunda expressão a forma “é possível que” modalizara a fala da pessoa, preservando-a de ser imediatamente presa ou até processada, de imediato. É isso que chamamos de modalizadores. São palavras que atenuam ou intensificam o que queremos dizer.
Os modalizadores contribuem para exteriorizar nossas atitudes diante do que expressamos. O tom de voz, por exemplo, muita coisa nos diz: amoooor! (a palavra amor pronunciada com um O alongado pode, entre os amantes, ser um convite para uma relação amorosa); a-MOR. (a palavra amor, com um tom de voz mais alto na sílaba MOR, pode estar manifestando uma advertência para um filho que, numa visita na casa de vizinhos, comporta-se não adequadamente. Os pais, tentando não exteriorizar explicitamente certa raiva, utilizam essa modalização no tom de voz).
É preciso muita atenção para o uso de modalizadores nos discursos que nos são manifestos, de modo que saibamos entender e compreender as reais intenções de nossos interlocutores.
Um político, por exemplo, pode (estamos dizendo pode!), em uma reunião, dizer para a comunidade que, se eleito, poderá construir o barracão comunitário por ela desejado; a comunidade, ouvindo isso, acredita piamente que foi assumido um compromisso definitivo. Triste ilusão, o político não disse irei construir. Há uma grande diferença entre poderei construir e irei construir: na primeira expressão, manifesta-se um discurso no plano da possibilidade, da incerteza; na segunda, o discurso da certeza, da convicção, da firmeza.
Fica-nos a questão, diante do exposto, para a necessidade de, pensando no outro que nos irá ler ou ouvir, sempre se indagar sobre o que se deseja expressar com o que se produz. A partir daí, caberá a escolha das palavras adequadas aos seus interesses. Lembre-se de que não são as palavras que nos devem dominar. Nós é que devemos nelas mandar.

2 Linguagem: opressão e emancipação
Sabemos que por meio da linguagem crianças são educadas, políticos são eleitos, justiça pode ser feita. Não é por acaso que o haja luz divino, segundo os escritos bíblicos, possibilitou a vida nesta terra, entendendo-se que “A linguagem é [...] a possibilidade que temos de simbolizar a realidade e agir sobre os nossos semelhantes - é a intencionalidade de nossos atos de fala" (RODRIGUES[5], 2003, p. 43)[6].
O problema está, entretanto, quando a linguagem passa a ser usada para oprimir o semelhante. Todos lembramos muito bem como os discursos nazistas convenceram muitos jovens alemães, por exemplo, a ceifarem milhões de vidas de judeus, na pretensa justificativa de um mundo eleito para uma raça pura em oposição a raças que, por lógicas científicas ideologicamente construídas, constituir-se-iam impuras. Aqui no Brasil,
[...] em São Paulo, alguns anos atrás, a imprensa de forma leviana expôs um provável caso de violência sexual numa escola infantil, por parte dos dirigentes e donos de um Estabelecimento de Ensino. Tal atitude sensacionalista fez com que os donos da escola fossem quase linchados, fazendo-os ainda perder toda uma vida profissional e empresarial adquirida com muito sacrifício durante longos anos. Após certo tempo, descobriu-se que os acusados foram vítimas de uma grande calúnia. Tentou-se amenizar o erro. Mas, infelizmente, a vida daqueles inocentes que foram submetidos a um vexame nacional já estava toda arruinada[7] (RODRIGUES[8], Doriedson. In: Jornal INFORME POPULAR, Cametá-Pará).

Ora, sendo a linguagem uma manifestação de poder e de persuasão, portanto, é necessário que o falante ou escritor sejam bastante éticos quando dela fazem uso, ponderando o que falam ou escrevem, a fim de não se tornarem reacionários, acabando com a vida de pobres mortais.
Em termos éticos, os vídeos, por exemplo, feitos em uma comunidade devem buscar preservar a integridade dos envolvidos na produção das imagens, no que se veicula nos vídeos, afinal estaremos lidando com pessoas que amam, que são pais, mães, filhos e tantas outras identidades. É preciso ter autorização, então, para postar o que se produz, buscando-se o termo de concessão de imagens, em que as pessoas que participam de um vídeo autorizam a veiculação das imagens.
Nas denúncias, veja que palavras usar, de modo a lhe preservar também a face pública, o respeito. Uma coisa, por exemplo, é dizer “você não presta!!!”; outra coisa é dizer “Você é uma pessoa com quem a gente não pode contar”.
E aí, qual das duas formas é mais suave, estando a preservar tanto sua face pública quanto a de seu interlocutor?
Não queremos dizer, contudo, que agora é para contermos nossos ímpetos de raiva. Não. Queremos alertá-lo para a necessidade de mediarmos o que escrevemos ou postamos, uma vez que poderemos estar representando instituições, outros sujeitos, um conjunto de pessoas que são diferentes, têm interesses diferentes e relações diferentes. Diante disso, precisamos ter estratégias de comunicação para interagirmos.

3 Comunicação e estratégias comunicativas
Um filósofo chamado John Austin (1990)[9] escreveu um livro em que desenvolveu a idéia de que quando dizemos, muito mais que dizer, fazemos coisas, ou seja, ao dizermos algo estamos fazendo algo. Assim, quando o namorado ou o casado dizem eu te amo estão realizando uma ação; estamos exercendo um ato que modifica a realidade entre pessoas. E ao criarmos coisas com a comunicação, temos de ter em mente de que muito estará não dito abertamente, mas implícito, escondidinho entre as palavras.
Esses implícitos, muitas vezes, constituem verdadeiros paradigmas[10] preconceituosos, os quais acabam formando homens e mulheres perpetuadores de opressão. Não é à toa que ainda hoje, em pleno século XXI, continuamos ouvindo "É muito inteligente para um preto" (ILARI, 2002, p. 97)[11] ou Ele é do sítio[12], mas não fala errado, como se as pessoas negras não fossem inteligentes ou as do sítio não falássemos[13] adequadamente.
Pois bem, essas informações implícitas são, geralmente, construídas em virtude da quebra de alguma máxima conversacional. Segundo Ilari (2002), apoiado no filósofo norte-americano Peter Grice, os interlocutores, ao interagirem, estão empenhados em construir coletivamente uma comunicação eficaz, aplicando as máximas conversacionais:
Ø  Diga apenas aquilo que você julga ser verdadeiro.
Ø  Diga as coisas que você quer dizer da melhor maneira possível (por exemplo: evite ser prolixo, confuso ou desnecessariamente rebuscado na escolha do vocabulário, etc.)
Ø  Diga o máximo que você pode dizer.
Ø  Só diga coisas relevantes para o propósito da comunicação.
(ILARI, 2002, p. 93)
Ora, quando uma dessas máximas, durante uma comunicação, é quebrada, significa que algo além do que se disse ou se escreveu está sendo dito; do mesmo modo quando se seguem fielmente essas máximas. Assim, quando em um outdoor alguém, em época eleitoral, afirma ser ético e amigo do povo, pode estar implícito que ele se coloque como melhor que o seu oponente por possuir duas características que, dito implicitamente, esse último não apresenta.
E ainda, se o escrito nesse outdoor foi construído laconicamente, com poucas palavras, deve ter sido porque quis informar muita coisa com seus poucos dizeres. É preciso, entretanto, considerar que implicitudes são mais facilmente entendidas quando amparadas em nosso conhecimento de mundo, daí a necessidade das conversas familiares, dos encontros nas comunidades cristãs, nos centros comunitários, dos namoros além do fascinante e belo beijo: é importante adquirir conhecimentos diariamente - e já ficou claro que isso não se dá somente na escola, mas na igreja, na associação que você pode estar participando, num centro comunitário, por exemplo.
Assim, como poderíamos inferir o quanto a sociedade é preconceituosa com relação à possibilidade de trabalhadores assumirem a direção deste país, se não conhecêssemos que o Ex-Presidente da República fora um torneiro mecânico? É comum, p. ex., afirmações do tipo "É muito articulado, para um ex-torneiro mecânico" (ILARI, 2002, p.97), como se essa característica, ser articulado, fosse somente qualidade de empresários e de indivíduos com doutorado.
Para uma breve análise pessoal, observemos quantas afirmações estigmatizadoras, preconceituosas, são-nos proferidas diariamente, as quais fomentam uma sociedade cada vez mais excludente, já que a linguagem usada retira o direito de o indivíduo se ver respeitado em sua individualidade, em suas diferenças. São estereótipos criados para dignificar uns e rebaixar outros:

"É esperta para uma loira".
Ø  Ora, a esperteza é uma característica de qualquer ser humano.
"È bastante educada para uma prostituta".
Ø  Ora, qualquer ser humano pode ser educado.
"O pau que nasce torto morre torto e não tem jeito".
Ø  Nossa! Ditados como esse alimentam a tese de que um ser humano não pode mudar de vida. Parece que tudo já está determinado.
"Sabe fazer política pra quem nunca fez uma universidade".
Ø  Ora, esse tipo de afirmação tende a excluir a possibilidade de qualquer ser humano exercer atos políticos, como se tal ação fosse uma prerrogativa somente de indivíduos detentores de títulos acadêmicos.

Por fim, para efeito didático do que apresentamos, indagamos: como trabalhar a comunicação em comunidade, nos movimentos sociais, nos grêmios estudantis, por exemplo, para contribuir com a quebra de preconceitos, com não propagação de idéias de que os trabalhadores não podem isso, não podem aquilo? Parece-nos que a resposta já se encontra numa atitude ético-política para com o trato da linguagem humana numa perspectiva de emancipação humana, para o que a compreensão das formas de a comunicação ocorrer é deveras importante.

4 As mensagens ocultas: a comunicação de massa

A linguagem não se realiza somente por meio do signo verbal. Muitas coisas que entendemos ou comunicamos também se fazem por meio de aspectos paralinguísticos[14] (gestos, movimentos, etc.).
Quantos namoros são confirmados com um simples olhar; quantos professores mudam suas aulas com um simples bocejo de seus alunos. A linguagem é uma mistura do verbal e do não-verbal. Na escrita, p. ex., tentamos manifestar muitas informações com uma simples pontuação, buscando expressar algum fato facilmente realizado na oralidade: Nossa! (talvez alguém vendo uma linda mulher); Nossa. (talvez alguém entediado diante de uma afirmação que considera totalmente sem sentido).
Se disso sabemos, uma enorme atenção devemos dar para as propagandas e imagens que nos são expostas. Não raro, elas nos induzem ao consumismo, à violência, à banalização da vida.
Cotidianamente somos levados a acreditar que nos falta aquele som potente - até parece que o nosso vizinho tem de ouvir o que gostamos -, que é agradável achar graça do sofrimento alheio - prestem atenção nas famosas pegadinhas das mesmices televisas de domingo -, que é fascinante brincarmos de matar nos vídeos games. Todos já sabemos, diziam nossos pais, que o cachimbo faz a boca torta.
Uma ligeira análise nas propagandas de cigarro, fato já há muito discutido em comunicações como esta, mostra-nos como somos levados, adocicadamente, a achar prazeroso o fumo, afinal ele está associado ao esporte, à masculinidade, geralmente. Em letras raramente graúdas aparece que cigarro é prejudicial à saúde.
Ora, todos sabemos que, na comunicação humana, existe o que é figura e o que é fundo. E nas propagandas de cigarro, a figura central, redundantemente, é o cigarro; a frase no final da propaganda é apenas fundo, detalhe que não sensibiliza com eficácia o auditório.
Do ponto de vista formativo, em termos de emancipação humana, há necessidade de buscarmos discernir o que é o principal em uma comunicação e o que, em termos pragmáticos, é secundário; mas secundário que está cumprindo funções sociais, persuasivas, sendo importante descobrirmos os nexos que os estão a unir, de modo construirmos significados para o que ouvimos, escrevemos, falamos, para o que muito pode nos ajudar a compreensão dos silogismos.

5 Um cuidado especial com os silogismos

Quantos de nós já não ouvimos que filho de peixe, peixinho é; que todo político é ladrão ou que ladrão que rouba ladrão tem cem anos de perdão. Declarações como essas realizam, geralmente, ações do tipo João é maconheiro, Pedro é filho de João, logo Pedro também é ou vai ser maconheiro, como também a tese de que não há políticos bons neste país ou que é possível roubar, desde que o roubado seja um ladrão.
Parece brincadeira, mas construções desse tipo alimentam uma sociedade cada vez mais banalizadora da própria vida. Já observamos pessoas ficarem felizes quando, ao perguntarem quem morreu, ouvem dizer que era um ladrão, afinal, segundo elas, é menos um mal na sociedade[15].
Esse tipo de raciocínio tem sido chamado de silogístico: "Quando as pessoas encadeiam duas sentenças, A e B, por meio das palavras logo e, portanto, dão a entender que a informação contida em B estava implicitamente presente em A. Mas os livros de lógica (e a vida) nos ensinam que o esquema A, logo B já foi muito usado para racionar de maneira errada". (ILARI, 2002, p. 90).
Do ponto de vista didático, a questão que colocamos é (i) como trabalhar para desfazer, via comunicação, vários silogismos criados na sociedade, como quem pode ocupar cargo público é filho de doutor, João não é filho de doutor, logo João não pode ser prefeito, vereador, deputado, senador, só para se dar um exemplo? (ii) Como promovermos ações para quebrarmos ilusões como essas? (iii) Como mostrarmos que trabalhadores sabem fazer as coisas e têm condições de exercerem a tomada dos rumos da história de suas vidas?
Muito mais que respostas, fica o alerta para a necessidade de também estarmos antenados para as formas como a classe trabalhadora neste país não raro vem sendo alijada da possibilidade, via linguagem, de atuarem como senhores da sociedade, de seus rumos, objetivando a construção de um mundo muito mais humano.

Para um final de conversa - minha palavra é meu penhor[16]

Por fim, cabe mais uma nota nessas nossas considerações que poderemos assim colocar: se a linguagem muitas vezes é utilizada para excluir e oprimir o homem, cabe a nós também mudarmos o enfoque.
Há uma necessidade de buscarmos mecanismos de comunicação que, cativando o ouvinte/leitor, contribuam para o aprimoramento da consciência crítica dos membros da sociedade.
É preciso criarmos condições, como a partir do uso das redes sociais, para que as comunidades possam ter acesso a conhecimentos que as ajudem a ler o mundo, os implícitos, os subentendidos, como também fomentar essas mesmas comunidades para o exercício de uma comunicação eficiente e eficaz no sentido de promover a dignidade humana, alertando o homem para seus direitos e deveres sociais.
A humanidade precisa urgentemente assumir a comunicação e a linguagem por ela utilizada como veículos de compromisso, não como instrumentos de dominação, de mentiras que satisfazem às expectativas momentaneamente, mas que não se materializam em ações concretas: o Te amo deve ser real, não mero objeto de persuasão para o consumo; a falta de educação e saúde em seu município (caso a realidade assim o seja) necessitam ser verdades materializadas em ações, não meros discursos populistas que dizem o que se quer ouvir; não se constituem compromissos - fala-se apenas o que o povo quer ouvir, a fim de obter-lhes o voto.
Precisamos assumir o compromisso de que se a comunicação/linguagem serve para oprimir, também serve para incluir socialmente, materializar ações socialistas, mediadas por outras formas de inclusão política e de classe, como as desencadeadas por meio das lutas camponesas, ribeirinhas, etc. Em termos de redes sociais, muito pode ser feito também para se contribuir com a inclusão social, de modo que os sujeitos sejam ouvidos, atendidos, respeitados, compreendidos.


[1] Doutor em Educação (UFPA). Mestre em Lingüística (UFPA). Membro do Grupo de Estudos e Pesquisas sobre Trabalho e Educação (GEPTE). Docente do Campus Universitário do Tocantins/Cametá-UFPA.
[2] BAKHTIN, Mikhail. Marxismo e Filosofia da Linguagem. São Paulo: Hucitec, 2006.

[3] Esse estudioso chama-se Mikhail BAKHTIN que escreveu o livro Marxismo e filosofia da linguagem: problemas fundamentais do método sociológico da linguagem. Se você quiser um dia lê-lo, procure a editora Hucitec de São Paulo. Há uma edição do livro feita em 2006.
[4] PESSOA, Marlos de Barros. Atitudes Lingüísticas de Professoras da Área de Língua Portuguesa em Escolas Públicas na Região Metropolitana do Recife. Recife: UFPE, Dissertação de Mestrado, 1989.

[5] RODRIGUES, D. S. Marcadores Conversacionais: um estudo sobre os Marcadores "Parente" e "-Qué tá? - Tá Bom" no Município de Cametá/PA. Cametá: Coleção Novo Tempo Cabano, 2003.
[6] Não estamos pontuando, contudo, que pela ação exclusiva da linguagem as condições de vida da humanidade possam ser mudadas, considerando o modo de produção excludente a que estamos submetidos, senão que por meio dela, em articulação com outras formas de lutas políticas, muita coisa pode ser feita, na perspectiva da emancipação humana.

[7] O artigo do qual esse excerto faz parte analisa a falta de ética quanto à veiculação de notas para uma comunidade que, geralmente não assinadas, escandalizam famílias, crianças, mulheres, cidadãos.  São textos altamente sensacionalistas e escandalizadores.
[8] RODRIGUES. Doriedson. Das dores: por uma ética no uso da língua escrita. In: JORNAL INFORME POPULAR: Informativo do Baixo Tocantins. Cametá: NOVO TEMPO CABANO, novembro, 2001.

[9] AUSTIN, John Langshaw. Quando dizer é fazer. Tradução de Danilo Marcondes de Sousa Filho. Porto Alegre: Artes Médicas, 1990.
[10] O linguista Ferdinand de Saussure, no seu Curso de Lingüística Geral, entendia que paradigmas referem-se às associações mentais que fazemos entre termos que não estão presentes quando falamos ou escrevemos. Esses termos estariam virtualmente no cérebro, sendo acionados quando desejamos nos comunicar. Assim, quando ouço natal logo me vêm à cabeça peru, presentes, família reunida, etc.
[11] ILARI, Rodolfo. Introdução à Semântica: brincando com a gramática. São Paulo: Contexto, 2002. SAUSSURE, Ferdinand de. Curso de Lingüística Geral. São Paulo: CULTRIX, 1995.
[12] No interior da Amazônia paraense, município de Cametá, ser do sítio refere-se à pessoa ribeirinha, que mora nas linhas.
[13] Como estamos tratando de implicitudes, veja como, conforme a tradição gramatical preconiza, fazendo uso da silepse de pessoa, manifestamo-nos, por inclusão (as pessoas + eu = nós; daí o verbo falássemos), como pertencente ao interior, marcando firmemente uma identidade amazônida: (...)"como se as pessoas negras não fossem inteligentes ou as do sítio não falássemos adequadamente".
[14] Para uma melhor reflexão sobre a relação verbal e não-verbal na construção de sentidos em contextos interacionais, recomendamos o artigo de SANTOS, Antônio Augusto Coelho dos; PLACHI, Daniela; RODRIGUES, Doriedson do S. O não-verbal e o lingüístico: uma reciprocidade na construção de sentidos em uma interação de sala de aula. Belém: UFPA/CML, 2003, VII Jornada de Estudos Lingüísticos e Literários.


[15] Tais atitudes tendem a escamotear sérios problemas sociais, como se o problema de violência, por exemplo, resultasse da incapacidade humana para o convívio social, não se responsabilizando o modo de produção capitalista que nos objetaliza a existência, não raro coisificando homens e mulheres.
[16] Tese desenvolvida por John Austin (1990, p. 9), segundo a qual os atos comunicativos têm (...)"um caráter contratual de compromisso entre partes".

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